domingo, 17 de agosto de 2014

          PARETO  E  A  CLASSE DOMINANTE

                


O sociólogo e economista italiano Vilfredo Pareto escreveu que uma classe para ser dominante precisa valer-se de dois atributos: a força do leão e a astúcia da raposa.

A classe dominante brasileira valeu-se da força para dominar desde o início da colonização das terras descobertas por Cabral. Serviu-se do trabalho escravo e da força em estado quase puro por 350 anos e em pouco mais de 100 anos de República poucos foram os lapsos de democracia, ou seja, de efetiva República, o mais longo foi este de 1985 até os dias atuais.

Viciada em governar abusando da força desde o Estado escravocrata e monarquista a classe dominante continuou controlando a força de trabalho por meio de um Estado que descumpre mais as leis do que as respeita, principalmente violando os DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CIDADÃO, os chamados DIREITOS HUMANOS.  

Tivemos uma polícia política de 1924 até 1983 quando as delegacias ou departamentos de ordem política e social - a depender do Estado tinha nome diferente, DOPS ou DEOPS -, foram formalmente sendo extintos.

No Rio GraNde do Sul foi extinto em 1982 e no Estado de São Paulo em 1983. Só foram formalmente extintos adiantadamente por ser incompatível a existência de uma polícia política com o Estado Democrático que se avizinhava com a Constituição de 1988 e também como medida de obstar o acesso aos arquivos repletos de volumosos prontuários revelando o modus operandi, o nome dos infiltrados, enfim, o uso do dinheiro público para perseguir inimigos de classe.

Nesta operação de despistamento, contra-informação e ocultamento simularam incêndios e destruição de documentos, mas ninguém acredita na incineração destes arquivos. Razões existem para isto, uma delas, os DOI-CODI’s nunca foram extintos, mudaram de nome para Subseção de Informações e o Exército continua obtendo cópias de todos os Inquéritos Policiais instaurados pela Polícia Federal.

As atribuições da antiga polícia política foram transferidas para a Polícia Federal [1] e os arquivos também, bem como ninguém tem dúvidas que por não terem sido disponibilizados para acesso aos cidadãos comuns os prontuários, mantidos em local secreto, estão sendo atualizados e ampliados.

AS ÚLTIMAS CONCESSÕES
                             
O Estado escravocrata e a coerção como instrumento de dominação em estado quase puro foi o treinamento básico da classe dominante mesmo depois do golpe de Estado que instaurou a República em 1889.

Assim, habituada a servir-se de ditaduras para dominar e para conter o avanço das conquistas iniciadas com a abolição do trabalho escravo a classe dominante está sem conseguir usar as artes da raposa, a dissimulação, a astúcia de que fala Pareto, para enganar as classes subalternas, mas principalmente não aprendeu a fazer concessões.

As concessões que começaram com a abolição do trabalho escravo só foram efetivadas com a divisão da classe dominante que resultou na Revolução de 1930 e a chegada de sua mais felpuda raposa ao comando do governo federal, Getúlio Vargas.

Somente em 1938 e em plena ditadura do “Estado Novo”, portanto, 50 anos depois da assinatura da Lei Áurea, foi instituído o salário mínimo, tornado realidade fática apenas em 1940. A CLTConsolidação das Leis do Trabalho -, sistematizando, unificando e ampliando direitos dos trabalhadores viria em 1942 criando também a Justiça do Trabalho, regulamentando além do salário mínimo, o descanso semanal remunerado e as férias anuais.

Antes da CLT as reivindicações do mundo do trabalho eram tratadas com repressão, como um caso de polícia, sem exceção, e os trabalhadores a mercê das mais brutais arbitrariedades do patronato pois sem nenhuma proteção legal que acautelasse direitos básicos.

Foi assim que o mais astucioso político da classe dominante brasileira ao criar a CLT e fazer concessões também deu um golpe mortal no movimento operário independente com a repressão policial brutal que caracterizou a ditadura do “Estado Novo” (1937-1945) e também por subordinar os sindicatos outrora livres ao Estado além de estimular a venalidade entre os trabalhadores ao criar o imposto sindical.

Conhecido por usar a repressão, por fazer concessões aos trabalhadores e pelo nacionalismo em economia Getúlio Vargas não deixou prosélitos na classe dominante.

A direita brasileira nunca teve como propósito construir um grande país, soberano, de cidadãos e não de súditos ou simples carvão usado no sistema de trabalho semi-escravo que temos. Já era para ter sido varrida do cenário político há muito e só não foi encostada contra o muro ou não fugiu para Miami porque o primarismo da esquerda marxista não permitiu a formação de inimigos qualificados para impor-lhe a derrota merecida.

Por não querer barganhar e ceder alguns privilégios a conhecida astúcia tão inerente às classes dominantes nem quando perpetrada com uso dos meios de comunicação tem obtido êxito na sempre recorrente tentativa  de satanização da esquerda. Uma mostra do fracasso deste ilusionismo é que nas eleições previstas para outubro o candidato direitista, Aécio Neves, poderá ser derrotado logo no primeiro turno pela Presidenta Dilma.

Sem poder recorrer à violência além da permitida por um Estado Democrático, mesmo com a democracia mais formal que substancial como é a nossa, a classe dominante “está sem discurso”, dizem articulistas capacitados, mas na verdade está sem discurso porque não quer fazer concessões, não quer perder os anéis para salvar os dedos. E sem fazer concessões ela não governa este país. A crise da classe dominante é mais profunda do que imaginamos.

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[1] A destinação da Polícia Federal está cinzelada no art. 144, § 1º, da Constituição Federal, ipisis literis

"§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se: 

I - apurar infrações contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;"




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